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#335 Devemos Orar por um Milagre?

May 16, 2015
Q

Caro Sr William Craig,

Eu espero que você responda a minha pergunta porque ela tem sido a principal objeção que me está impedindo deconverter ao cristianismo, embora eu ache a maior parte coerente e eminentemente atraente.

Minha pergunta é sobre a providência divina. Nos Evangelhos Jesus ensinou seus discípulos a orar a Deus, pedindo-lhe: "dá-nos hoje o pão de cada dia". Em outras partes, ele também compara Deus a um pai amoroso que sempre dá aos seus filhos o que eles pediram (desde que fosse razoável).

A partir da formulação utilizada por Jesus, parece claro que ele estava se referindo às necessidades básicas, materiais, tais como alimento e roupa. No entanto, na realidade, parece que Deus muito raramente responde a essas orações. Padres hoje incentivam-nos a pedir por necessidades espirituais, como coragem e caridade, mas não pelo nosso pão de cada dia. E eles fazem isso por aparentemente boa razão, uma vez que, fundamentalmente, o mundo corre de acordo com as leis físicas imutáveis e a menos que Deus faça milagres (o que é bastante raro) as coisas simplesmente acontecem porque as leis físicas as forçam a acontecer dessa forma. Na verdade, Deus parece não ter nenhuma maneira de responder a maioria das orações além de violaR as leis da natureza, e nós razoavelmente não devemos esperar que Deus viole rotineiramente as leis que ele estabeleceu. Por isso, não devemos razoavelmente esperar que Deus responda nossas orações.

Portanto, parece que a oração ensinada por Jesus ou é inútil, ou deve ser entendida em sentido espiritual. Enquanto eu não sou um exegeta, parece-me que a frase "dá-nos hoje o pão de cada dia" é insistente demais na noção das necessidades básicas imediatas, concretas, para que uma interpretação espiritual seja satisfatória.

Eu sinto que este ponto é fundamental demais para ser posto de lado como "misterioso" e eu não posso crer em Cristo sem entender por que ele nos ensinou a orar dessa maneira.

Agradeço antecipadamente a sua consideração e gostaria de aproveitar esta oportunidade para agradecer-lhe por seu trabalho do qual eu sou um grande fã.

Sinceramente,

André

Canadá

  • Malta

Dr. Craig

Dr. craig’s response


A [

Eu tenho boas notícias para você, André! Eu acredito que eu possa responder à sua pergunta e, assim, remover o último obstáculo para você se tornar cristão.

O que você está procurando é uma doutrina da providência que encontre um meio-termo entre eventos cheios de intervenções milagrosas e eventos produzidos por causas puramente naturais. A teoria Molinista da providência divina supre exatamente o que você está procurando.

A teoria Molinista da providência é baseada na doutrina do conhecimento médio divino do teólogo jesuíta, do século XVI, Luis Molina. De acordo com Molina, Deus sabe, não somente tudo o que poderia acontecer e tudo o que vai acontecer, mas também tudo o que iria acontecer em qualquer circunstância. Por exemplo, Ele sabe o que você teria feito livremente com Jesus se você tivesse sido o governador da Judéia, em vez de Pôncio Pilatos.

Além disso, Ele sabe disso explicativamente antes do Seu decreto para criar um mundo particular. Seu conhecimento médio serve para guiá-Lo em Sua escolha de qual mundo tornar real.

Suponhamos que Deus sabia que, se você estivesse em um determinado conjunto de circunstâncias, você iria livremente orar pelo seu pão de cada dia. Suponha, ainda, que Deus quer responder a essa oração. Ele deve então intervir milagrosamente no mundo a fim de fornecer o seu pão de cada dia? Ele deve, por exemplo, criar pão milagrosamente, do nada, no seu armário de cozinha? Ou Ele deve, milagrosamente, causar disparos dos neurônios no cérebro do padeiro local, levando-o a vir a sua casa com um pedaço de pão recém assado?

Não, pois Deus pode configurar com antecedência causas puramente naturais que iriam fornecer-lhe o pão que você precisa, ou, circunstâncias puramente naturais em que Ele sabia que alguém iria livremente dar-lhe o pão pelo qual você vai orar. Essas causas ou circunstâncias anteriores podem igualmente ser provocadas por Deus da mesma forma, sem intervenção milagrosa, lá na Sua criação do universo.

Então, quando você ora, Deus não deve, naquele ponto, fazer uma ação para trazer a resposta às suas orações. As causas naturais e circunstâncias podem já ter sido postas em lugar que vai trazer a provisão apenas no momento em que Deus sabia que você ia orar.

Claro, isso levanta a pergunta: "E se eu não fosse orar? Uma vez que as causas e as circunstâncias suficientes para trazer a resposta já estão no lugar, a oração não é supérflua?" Nem um pouco! Porque, se você fosse orar, Deus saberia disso de antemão, via Seu conhecimento médio e, por isso, não teria criado as causas e as circunstâncias em primeiro lugar! Você é inteiramente livre para orar ou não; mas o que você não pode fazer é fugir do conhecimento médio de Deus. Tudo o que você iria fazer livremente nessas circunstâncias já era conhecido por Deus e, então, Ele pode estabelecer as causas anteriores e circunstâncias para provocar uma resposta apropriada, se Ele assim o desejar. (É claro, isso é a Seu critério, e Ele nem sempre nos dá o que pedimos em oração.)

O que tudo isto significa é que, entre os eventos provocados pela providência extraordinária de Deus (intervenções milagrosas) e eventos provocados pela Sua providência ordinária (eventos que ocorrem regularmente como produtos de causas puramente naturais), há uma terceira categoria que podemos chamar de providência especial de Deus, ou seja, eventos que são o resultado de causas puramente naturais, mas que não são usuais em termos de seu tempo e contexto especial. Por exemplo, se ao George Muller dar graças pela provisão de Deus do pão de cada dia para seu orfanato, sabendo o tempo todo que eles não têm comida e, naquele momento, um caminhão de padaria quebra na rua e dá todas as suas provisões para o orfanato, então podemos considerar isso como uma resposta à oração, mesmo se são causas totalmente naturais da quebra do caminhão exatamente naquele tempo e lugar. É uma providência especial de Deus, previamente arranjada, em resposta à oração de Muller.

Esta doutrina da providência Molinista é um tremendo incentivo à oração, a propósito, porque ela não exige a fé por um milagre. Você pode orar para que Deus lhe dê um emprego, por exemplo, sem pensar que durante a sua entrevista de emprego Deus deve causar disparos neurais milagrosos no cérebro do chefe fazendo-o contratá-lo.

Obviamente, eu não estou dizendo que Deus nunca faz milagres em resposta às orações, mas apenas que não é sempre necessário para que Ele responda às nossas orações.

Assim, embora eu concorde com você que "nós razoavelmente não devemos esperar que Deus viole rotineiramente as leis que ele estabeleceu no lugar", não se segue que "nós razoavelmente não devemos esperar que Deus responda nossas orações", já que, dado o conhecimento médio divino, é falso que "Deus parece não ter nenhuma maneira de responder a maioria das orações, além de violar as leis da natureza."

Dito isto, André, eu quero terminar esta resposta em uma nota pastoral. Eu acho que as nossas necessidades mais importantes são as espirituais e não as materiais. Eu o encorajo a fazer um estudo das orações de Paulo para as igrejas que ele escreveu em suas cartas no Novo Testamento. É impressionante quão pouco Paulo orou pelas necessidades físicas delas, em contraste com as suas necessidades espirituais. Por exemplo, Paulo orou pelos filipenses que "que o vosso amor cresça mais e mais em ciência e em todo o conhecimento, para que aproveis as coisas excelentes, para que sejais sinceros, e sem escândalo algum até ao dia de Cristo; cheios dos frutos de justiça, que são por Jesus Cristo, para glória e louvor de Deus."(Fil. 1:9-11). Eu acho que muitas vezes nossas orações não são respondidas porque estamos simplesmente orando pelas coisas erradas.

- William Lane Craig