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#350 Deus Permitindo o Mal Natural

May 16, 2015
Q

Hey Dr. Craig,

Eu espero que você pudesse me ajudar a resolver uma questão sobre o mal natural, a qual surgiu quando eu estava passando por cima de algumas notas da minha aula de filosofia que tomei no semestre passado. Eu tenho tentado conciliar o mal natural com a existência de Deus, impulsionado pela teoria da criação, construção da alma, como postulado pelo pai da Igreja Irineu, mas eu continuo chegando a um beco sem saída. Aqui está o meu processo de pensamento:

Usando as mesmas ideias que muitos defensores usam, eu posso entender o fato de que Deus permite o mal para usá-lo para bons propósitos. Não é confortável para muitas pessoas, mas faz sentido logica e teologicamente. Aí eu não tenho problema. A mesma ideia é usada com o mal natural em muitos casos. Deus permite para que amadureçamos, nossas almas cresçam e, finalmente, para trazer as pessoas a Ele. No entanto, há uma palavra que não faz sentido para mim, essa palavra é "permitir". Certamente Deus permite o mal, mas com relação ao mal natural parece ser mais do que isso. Já que a natureza está em um caminho determinado, eu suporia que uma vez que ela não tem voz no que faz, não se segue que aquele que determinou aquele caminho é o responsável pelas atrocidades naturais que ocorrem na criação? Eu entendo que Deus poderia permitir que males aconteçam, mas, no caso do mal natural, parece que Deus está causando que os males aconteçam. Nós usamos esta mesma linha de pensamento na discussão da minha classe de livre arbítrio para mostrar que se Deus determinou nossas ações, então Ele é responsável por elas.

Agora, a única maneira de eu ver uma saída neste problema é negar que os males naturais são realmente mal. Eu não acredito que sejam todos um julgamento ou um resultado da queda de Adão, já que as catástrofes são simplesmente o resultado de processos naturais. Dito isto, por que nós os chamamos de mal? Por que não nos alegramos ou agimos indiferentes sempre que um tsunami atinge Sri Lanka? Por que pensamos que as coisas deveriam ser de uma maneira diferente?

Deixe-me dizer desta forma. Esses eventos naturais evocam em nós respostas emocionais como tristeza, piedade, compaixão e afins. Isso é tudo muito bom na teoria da construção de alma de Irineu. Nós deveríamos estar nos desenvolvendo como pessoas, como almas. No entanto, o conflito parece surgir quando olhamos para a questão desta forma. Essas respostas emocionais acontecem no caso do mal moral quando somos expostos a um evento e nós raciocinamos que as coisas não deveriam ser assim, que há uma maneira melhor que as coisas poderiam ser. Este sentido de "dever" vem de Deus, como você tem defendido em seu trabalho. No caso do mal natural, as mesmas emoções surgem, evocando em nós uma resposta de que as coisas deveriam ser de uma forma diferente da que elas são. Por que estamos certos ao sentir essas emoções se Deus já colocou no lugar o que vai acontecer quanto aos processos naturais?

Eu realmente estou preso neste assunto. Todas as pessoas que abordam este problema parecem nunca fazer a ligação entre Deus sendo o criador dos processos naturais e [por exemplo] os processos fixos, sendo responsável pelo mal natural. Usando essa lógica, se os processos são determinados, Deus é a causa do mal natural, o que muda tudo sobre o Deus Cristão, a menos que não seja realmente mal. No entanto, os problemas acima chegam a uma parede. As emoções com que Deus nos criou nos dizem que as coisas deveriam ser diferentes do que o que Deus estabeleceu. Mas, se os eventos não são mal, então eles são bons e uma parte da vontade de Deus e a nossa moral pareceriam estar guiando-nos errado. E se isso é verdadeiro, como podemos confiar em nossa moralidade? Estou preso em um ciclo vicioso aqui!

Eu entendo que haja consequências naturais para nossas ações, como C.S. Lewis destacou em "O Problema do Sofrimento", mas estes eventos naturais estão fora de nosso controle e completamente no de Deus. Você muitas vezes usa o exemplo de placas tectônicas como um exemplo de mal natural que tem muitas boas consequências. Mas não foi Deus que criou as leis pelas quais as placas agem? Não há um mundo possível funcional onde os males naturais são evitados e são permitidos somente os males morais? Deus pode ter um propósito em permitir males naturais? Como Ele pode ordená-los?

Qualquer ajuda seria muito apreciada. Eu não consigo evitar de fazer de Deus o Autor deste mal.

A menos que a criação realmente tenha sido afetada pela queda de Adão.

Nick

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Dr. Craig

Dr. craig’s response


A [

Como você pode imaginar, Nick, há tanta coisa que poderia ser dita sobre a sua pergunta!

Em um nível, a sua pergunta não é realmente muito sobre o problema do mal, mas sobre a doutrina da providência divina. Você está preocupado com o fato de que Deus não se limita a permitir, mas é a causa dos males naturais no mundo. Agora claramente, o teísta cristão não acredita que Deus milagrosamente intervém para fazer cada terremoto, furacão, deslizamento de terra, ou ocorrência natural do mundo. Assim Ele não é a causa direta de tais eventos. No máximo Ele pode ser referido como a causa remota desses eventos no sentido de que Ele estabeleceu as leis naturais que governam o universo e as condições de contorno iniciais em que essas leis operam. Vamos imaginar que Deus tenha feito isso no Big Bang e nunca interveio posteriormente de forma milagrosa no mundo. Sua afirmação é que Deus é, portanto, a causa de todos os males naturais subsequentes que ocorrem na história do mundo.

Agora, observe que sua inferência pressupõe que "a natureza está em um caminho determinado". A sua perspectiva é a de LaPlace, que se gabava de que, equipado com as leis de Newton e do conhecimento da posição e velocidade de cada partícula do universo presente, ele poderia prever o estado exato do universo em qualquer momento no passado ou no futuro. A exibição de LaPlace é falsa se a indeterminação quântica é ôntica, não meramente epistêmica, ou seja, realmente característica da natureza, em vez de uma expressão de nosso conhecimento limitado da natureza. Este tipo de indeterminação é ampliado rapidamente ao longo do tempo. Disseram-me, por exemplo, que dada a indeterminação inerente à posição/velocidade de uma bola de sinuca, até onde sabemos, com apenas doze batidas da bola, ela poderia estar localizada em qualquer lugar na mesa de sinuca! Claramente, se a indeterminação quântica é ôntica, Deus não poderia causar um terremoto em um momento específico, simplesmente colocando as leis naturais e as condições iniciais do universo. Se um terremoto ocorresse, seria apenas porque Deus não interveio para impedir. Ou seja, Ele permitiu. Problema resolvido.

Mas vamos supor que, como eu estou inclinado a pensar, a indeterminação quântica é, de fato, apenas epistêmica, não ôntica. E aí? Isso faz de Deus a causa (remota) de todo o mal natural? Bem, não. Pois o que é ruim sobre males naturais não é simplesmente a ocorrência de certos eventos naturais em si. Não há nada de mal, por exemplo, com uma placa continental deslizando sob outra, nem com o tremor de terra como um resultado. Tais eventos naturais são, eles próprios, eticamente neutros; a moralidade não se aplica às rochas e chuva e vento. Pelo contrário, se há algo de ruim sobre tais acontecimentos, é que os seres humanos são pegos neles. Como você diz, sentimos que as crianças não devem ser arrastadas para o mar e se afogar em maremotos. (Note, a propósito, que há um poderoso argumento teísta à espreita aqui, como meu colega Douglas Geivett assinalou. Pois o naturalista não tem base para dizer que um tsunami que varre uma ilha do Pacífico é uma coisa ruim. Pode ser ruim para os habitantes da ilha, mas é um grande benefício para a vida marinha que circunda a ilha! Se você dizer que tais coisas não deveriam ser, então você está tacitamente reconhecendo que existe uma maneira como as coisas deveriam ser. Isso é reconhecer um plano de projeto para que tais eventos não conformam. Mas isso requer um designer cósmico que determinou como as coisas deveriam ser.)

Mas se o que é ruim é que seres humanos são apanhados e feridos em tais eventos naturais, então é claro, dada a liberdade humana, que Deus não é a única causa do mal natural. Pois Ele não levou as pessoas a estarem nos tempos e lugares onde os eventos naturais ocorreram. É claro que isso não quer dizer que as pessoas sejam culpadas por estarem nos tempos e lugares em que estão quando ocorre uma catástrofe. Dada a ignorância humana, elas são apenas vítimas do azar. É simplesmente dizer que Deus não faz a única contribuição causal para a realidade de um estado natural ruim das coisas. Mais uma vez, o que Ele fez foi permitir que as pessoas estivessem no lugar e hora quando o desastre aconteceu. Agora, os não-teístas, sem dúvida, diriam que tal lassidão da parte de Deus é responsável o suficiente, mas esse não é o ponto da sua pergunta, Nick. Você quer saber apenas se pode ser significativamente dito que Deus permite ao invés de causar males naturais. A resposta a essa pergunta é que claramente isso pode ser sensatamente mantido.

Além disso, o teísta vai argumentar, como você nota, Deus tem razões moralmente suficientes para permitir que os males naturais ocorram, de modo que Ele não pode ser considerado como tendo agido de forma errada ao permitir que tais desastres aconteçam. O não-teísta erra ao pensar que "o que não deve ser" não deve ser permitido. Mas Deus pode ser justificado em permitir estados maus de coisas. Por exemplo, eu acho que é muito plausível que apenas em um mundo que está impregnado com o mal natural levaria um grande número de pessoas livremente conhecer a Deus e encontrar a vida eterna. Em um mundo totalmente desprovido de mal natural, provavelmente seríamos crianças mimadas, esquecendo-nos de Deus, agentes morais imaturos - uma ênfase que encaixa perfeitamente com sua própria teodiceia de construção de alma. Portanto, não é errado da parte de Deus permitir que as catástrofes naturais, não mais do que seja errado que eu deixe o meu filho fosse ao dentista.

- William Lane Craig