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#367 Descontando a Erudição do Jesus Histórico

May 16, 2015
Q

Caro Dr. Craig,

Em primeiro lugar quero agradecer pelo seu trabalho em nome do cristianismo. Eu realmente gosto de ver os seus debates e ler seus livros.

Agora a minha pergunta: é sobre o academicismo do Novo Testamento (NT).

Em seu argumento sobre a ressurreição de Jesus, você diz que a grande maioria dos historiadores do NT aceita:

1) A morte de Jesus

2) O túmulo vazio

3) As aparições da ressurreição

4) Seus discípulos vindo a acreditar

Eu sei que Gary Habermas compilou uma lista de obras sobre este tópico, a qual confirma sua afirmação.

Eu já ouvi muitas vezes, como um contra-argumento, se há mesmo céticos neste campo de trabalho. A probabilidade é de que a maioria dos historiadores do NT estão inclinando-se ao cristianismo, porque ninguém iria estudar um tema que acha um absurdo, ou simplesmente não está interessado. Mas os eruditos do NT realmente fazem isso como profissão.

Portanto, o resultado que a maioria dos estudiosos do Novo Testamento aceita estes quatro fatos não é realmente um argumento, porque o seu trabalho/opinião será fortemente tendencioso.

Eu gostaria que você comentasse sobre isso.

Obrigado

Jasper

Alemanha

  • United States

Dr. Craig

Dr. craig’s response


A [

Aqueles que tentam descontar as opiniões da maioria dos estudiosos do Novo Testamento sobre determinadas questões com base em viés cristão só mostrar como eles são ingênuos sobre estudos históricos de Jesus. Embora seja sem dúvida verdade que os cristãos serão desproporcionalmente representados no academicismo do NT em contraste com várias disciplinas seculares, é demasiado simplista descartar as conclusões do academicismo do NT como fortemente tendenciosas e, portanto, facilmente descontada.

O fato é que estudiosos do Novo Testamento têm sido no todo um grupo extremamente cético. Não há uma única passagem nos evangelhos que não tenha sido submetida à crítica mais severa. R. T. França, um estudioso britânico do NT, escreveu,

No nível de seu caráter histórico e literário, temos boas razões para tratar os evangelhos seriamente como uma fonte de informações sobre a vida e os ensinamentos de Jesus, e portanto, sobre as origens históricas do cristianismo. Os historiadores antigos, por vezes, comentaram que o grau de ceticismo com que estudiosos do Novo Testamento se aproximam de suas fontes é muito maior do que seria considerado justificado em qualquer outro ramo da história antiga. De fato, muitos historiadores antigos se diriam afortunados por terem quatro relatos tão responsáveis, escritos no prazo de uma ou duas gerações dos eventos, e preservados em tal riqueza de evidências de manuscritos antigos [...] Além desse ponto, a decisão sobre quão longe um acadêmico está disposto a aceitar o registro que eles oferecem é susceptível de ser mais influenciada por sua abertura a uma visão de mundo 'supernaturalista' do que por considerações estritamente históricas.[1]

Como alemão, Jasper, você de todas as pessoas deveria estar ciente disso. O academicismo (erudição) alemão, que tem dirigido o estudo bíblico crítico por 200 anos, tem sido extremamente cético dos registros do NT da vida de Jesus. Estudos sobre o Jesus histórico foram moldados pela influência avassaladora de David Friedrich Strauss, cujo livro “Life of Jesus, Critically Examined” (1835), motivado pelo argumento de Hume contra os milagres, deu o tom para a pesquisa do Jesus histórico moderno. Bem, até o final do século XIX, alguns eruditos, como Bruno Baur, foram tão longe que negaram que Jesus de Nazaré sequer existiu! Este ceticismo estendeu-se até de meados do século XX, com o trabalho influente de Rudolf Bultmann, que considerou que as tradições sobre Jesus foram tão remodeladas pela mitologia que tudo o que nós sabemos sobre o Jesus histórico poderia ser escrito em um cartão de 4X6! Escusado será dizer que tal ceticismo reinou no que diz respeito aos eventos da ressurreição de Jesus como seu enterro e túmulo vazio.

Foi durante a década de 1950 que o velho paradigma cético começou a desmoronar. Um dos desenvolvimentos mais importantes em estudos históricos de Jesus é o que tem sido chamado de "rejudaização de Jesus." Percebeu-se que o contexto interpretativo adequado para a compreensão de Jesus e os evangelhos não é a mitologia pagã, mas o judaísmo do primeiro século palestino. Por isso, há hoje um interesse considerável entre os estudiosos históricos judaicos em Jesus, como um dos seus. Esta recuperação do judaísmo de Jesus levou a uma nova apreciação da credibilidade histórica dos evangelhos e a um eclipse da mitologia como uma categoria relevante nos estudos históricos de Jesus.

Essa reapreciação da credibilidade histórica dos evangelhos como fontes para a vida de Jesus abrange o que os estudiosos alemães chamam de "das GeschickJesu", isto é, o que aconteceu com Jesus após sua crucificação. Em contraste com os estudiosos do Novo Testamento da geração Bultmann e anteriores, estudiosos contemporâneos do NT, incluindo estudiosos judeus, levam a sério a historicidade do sepultamento de Jesus por um membro do Sinédrio judaico (cujo nome até sabemos!) e a descoberta de seu túmulo vazio por um grupo de mulheres seguidoras de Jesus. É, além disso, praticamente universalmente aceito que os primeiros discípulos tiveram experiências de ver Jesus vivo depois de sua morte e que eles vieram de repente e sinceramente à crença que ele foi ressuscitado dentre os mortos.

Tal reversão da erudição e unanimidade não pode ser plausivelmente descartada devido ao viés cristão. Tenha em mente que ser pessoalmente um cristão não implica ou exige que um estudioso vá concluir que as evidências são suficientes para comprovar algum fato relacionado aos evangelhos. Mesmo se eu acredito, por exemplo, que Jesus nasceu em Belém, isso não implica que eu acho que o seu nascimento em Belém — para não falar do nascimento virginal de Jesus! — pode ser historicamente comprovado! Da mesma forma, pode-se acreditar que Jesus ressuscitou dos mortos e ainda assim achar que os fatos de seu enterro e túmulo vazio não podem ser comprovados historicamente com base em evidências. O fato de que a grande maioria dos estudiosos do Novo Testamento acha que esses fatores podem, em contraste com as histórias de nascimento, ser estabelecidos com razoável confiança, diz algo sobre a força da evidência. Se viés fosse culpado, então esses eventos no início e no final da vida de Jesus deveriam ser considerados demonstrados com igual confiança.

De fato, como a declaração de France acima mostra, é, na verdade, um viés para o naturalismo que desequilibrou o julgamento histórico de muitos eruditos do Novo Testamento contra a historicidade de vários eventos dos evangelhos. (Veja, por exemplo, meu artigo “Redescobrindo o Jesus Histórico: Pressuposições e Pretensões do Jesus” ou a pergunta da semana passada relativa à avaliação de John Dominic Crossan das tradições funerárias e túmulo vazio). Se isto estiver certo, então a liberdade de estudiosos cristãos (podemos esperar) de tal preconceito vai realmente servir para torná-los mais objetivos no que diz respeito à avaliação da evidência. Isto é exatamente como deveria ser, pois o sepultamento de Jesus e até mesmo a descoberta de seu túmulo vazio não são, eles próprios, eventos sobrenaturais ou miraculosos, mas eventos naturais. É só quando lhes explicamos que o aspecto do supernaturalismo levanta sua cabeça. E eu nunca sugeri que a maioria dos estudiosos do Novo Testamento defende uma explicação sobrenatural desses fatos — somente que eles reconhecem a historicidade do enterro de Jesus, do túmulo vazio, das aparências pós-morte, e da origem da crença dos discípulos na sua ressurreição. Pode muito bem ser o caso de que a maioria dos novos historiadores do NT, sejam eles cristãos ou não-cristãos, achem que tal inferência ultrapassa o âmbito das suas competências.

Finalmente, o que precisa ser mantido em mente em tudo isso é que, o que importa no final, é a evidência que tem convencido a maioria dos estudiosos. Isto não é sobre a contagem de narizes, mas sobre pesar a evidência histórica dada em apoio dos quatro fatos em questão. O apelo para a opinião da maioria é útil principalmente, não como um argumento, mas como uma maneira de dizer: "Não sou só eu que acho esses argumentos convincentes. A maioria dos historiadores especialistas também acham. "A tentativa fácil e de desconsiderar a avaliação deles como tendenciosa, em última análise, não importa, porque é a evidência, e não os preconceitos do historiador,[2] que determina se algo deve ser considerado histórico ou não.


[1]Notas:

1 R. T. France, “The Gospels as Historical Sources for Jesus, the Founder of Christianity,” Truth 1 (1985): 86.

[2] Veja o meu capítulo sobre a objetividade da história em Reasonable Faith, 3ª ed. (Whaton, Ill.: Crossway, 2008). O problema da falta de neutralidade é um problema comum em filosofia da história, não exclusivo aos estudos em NT.

- William Lane Craig